7/13/2010

OS PRINCÍPIOS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA




OS PRINCÍPIOS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA
Marcus Eduardo de Oliveira


Embora os manuais de Introdução à Economia recomendem o individualismo e economias descentralizadas, um mundo mais solidário e fraterno somente terá lugar e vez quando os agentes econômicos juntarem forças e, coletivamente, pensarem numa mesma direção, qual seja: erradicar os males econômicos e sociais (fome, pobreza, miséria, desnutrição, morte) que cercam o atual ambiente econômico.
Digo juntarem forças, pois isso é possível. Basta, para tanto, que os países desenvolvidos mudem radicalmente a maneira de agir e vislumbrem buscar o desenvolvimento econômico equilibrado, situação em que todos ganham, visto que isso não se trata de jogo de soma zero, em que os ganhos de uns significam a perda de outros.
O montante que os países desenvolvidos destinam por ano à luta contra a AIDS, por exemplo, representa somente três dias de gastos militares da economia mais poderosa do planeta. Enquanto o governo de Barack Obama continua gastando apenas 1% de seu orçamento com ajuda internacional, outros 25% do mesmo orçamento estão sendo gastos em atividades militares que somente semeiam a morte e a destruição. Essa é apenas uma dentre tantas outras mudanças que precisa acontecer.
Os países ricos precisam entender uma simples lógica econômica: é muito mais barato e vantajoso, para todos, erradicarem a pobreza e a miséria que manter a atual e vexatória situação. De US$ 500 milhões a US$ 1 trilhão é o custo anual estimado da fome no mundo, incluindo perda de produtividade, renda, investimento, consumo. Com apenas US$ 25 milhões por ano, entretanto, seria possível reduzir drasticamente a desnutrição nos 15 mais famintos países da África e salvar da fome pelo menos 900 mil crianças até 2015.
Somente uma mudança radical na maneira de agir por parte do mundo rico porá fim à ignomínia maior dos tempos atuais que, indiscutivelmente, está refletida na escandalosa cifra de 1 bilhão de famintos – um sexto da humanidade lutando para sobreviver.
Todos os anos, quase 8 milhões de pessoas morrem no mundo em conseqüência da miséria e da pobreza. Os três níveis de pobreza (extrema, moderada e relativa) atingem em cheio a Ásia Oriental, Ásia Meridional, África Subssariana e parte considerável da América Latina. No conjunto, esse 1 bilhão de miseráveis (que estão na pobreza extrema) mais 1,5 bilhão de pobres (nas pobrezas moderada e relativa) somam 40% da Humanidade. Numa matemática simples, uma em cada sete pessoas padece de fome no mundo; 11 mil crianças morrem a cada dia; um terço das crianças dos países em desenvolvimento apresentam atraso no crescimento físico e intelectual; 1,3 bilhão de pessoas no mundo não dispõe de água potável; 40% das mulheres dos países em desenvolvimento são anêmicas e encontram-se abaixo do peso .
Diante disso, cabem indagações: Até quando será permitida essa aberração social? Até quando será permitido conviver com esse desrespeito à vida humana?
Conquanto, sempre é possível sonhar com um amanhã melhor.
Em tempos de mundo globalizado onde as informações se disseminam numa velocidade assustadora, começa a ganhar cada vez mais espaço a discussão em torno da prática da economia solidária. Em que consiste afinal o princípio da economia solidária?
Grosso modo, a “Economia Solidária constitui o fundamento de uma globalização humanizadora, de um desenvolvimento sustentável, socialmente justo e voltado para a satisfação racional das necessidades de cada um e de todos os cidadãos da Terra seguindo um caminho intergeracional de desenvolvimento sustentável na qualidade de vida”.
Os princípios gerais que norteiam essa idéia de economia solidária são: a valorização social do trabalho humano; o reconhecimento do lugar fundamental da mulher e do feminino numa economia fundada na solidariedade; a busca de uma relação de intercâmbio respeitoso com a natureza, e os valores da cooperação e da solidariedade, um caminho que valoriza os seres humanos, independente da sua cor de pele, sexo, idade, orientação sexual, condição econômica ou cultural.
Com essa maneira diferenciada de pensar e de “fazer” economia, talvez esteja começando a se abrir um novo caminho em termos da construção de um mundo mais solidário em que o indivíduo seja o foco principal; longe, portanto, da frieza dos números e dos índices que marcam a economia de mercado.
Se grande parte de nós nos envolvermos ativamente nos esquemas da solidariedade, abraçando a economia solidária em toda sua amplitude, talvez possamos forçar as mudanças econômicas tão almejadas. Se essas mudanças acontecerem e se os governos desenvolvidos perceberem nisso uma possibilidade de espalhar o desenvolvimento econômico sadio para todos, os ganhos, certamente, virão.
Esses ganhos tenderão então a serem coletivos, contrariando, assim, a prática econômica que recomenda o individualismo, conforme apontamos no início do texto.
Por fim, cumpre resgatar as palavras do embaixador brasileiro Rubens Ricupero no prefácio a The End of Poverty: How we can make it happen in our lifetime, de Jeffrey Sachs quando assim acentua: “que tenhamos um apelo à nossa consciência para despertarmos ao sofrimento que nos acossa e sitia em cada esquina, em cada sinal ou encruzilhada de trânsito, em todos os lados. Pois, se é verdade que cada sociedade terá que ser julgada segundo o critério do tratamento que dispensa a seus membros mais frágeis e vulneráveis, essa verdade não se aplica somente ao julgamento da sociedade americana em relação à África, mas a cada latino-americano, a cada brasileiro, que deve justificar sua existência na abundância do século XXI, ao lado da esqualidez de 400 milhões de nossos conterrâneos pobres ou indigentes”.

Marcus Eduardo de Oliveira é economista brasileiro e professor universitário.
Articulista de economia, além dos textos publicados em Angola, seus textos foram também publicados na Rússia e em Cabo Verde.
Seu mais recente livro é “Pensando como um Economista”, publicado no Brasil pela eBookBrasil

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